“Cada dia que amanhece a gente tem a oportunidade de recontar a nossa história através da arte”. A frase de Jean Carlos de Aguinel, 38 anos, usuário do Centro de Referência Especializado Para População em Situação de Rua (Centro Pop), descortina uma realidade ainda pouco conhecida. Jean é um dos 25 cidadãos em situação de rua atendidos pelas unidades da Secretaria de Desenvolvimento Social (SDS) e da Associação Municipal de Apoio Comunitário (Amac), a apresentar seu trabalho na exposição “Rua, Arte e Fé”. A exibição foi aberta na manhã desta quinta-feira, 9, no Centro Cultural Bernardo Mascarenhas (CCBM), reunindo trabalhos de atendidos do Centro Pop e da Casa de Cidadania.
A exposição foi concebida com releituras e adaptações das obras de Arthur Bispo do Rosário e José Datrino, o “Profeta Gentileza”, ícones da arte nas ruas. Na abertura, o secretário de Desenvolvimento Social, Flávio Cheker, defendeu o papel da arte na educação e reinserção social dos atendidos: “Toda vez que vocês se dedicam a esse tipo de atividade, vocês expressam o pensamento e o sentimento de vocês. E quando a inspiração do trabalho vem de dois artistas como o ´Profeta Gentileza` e Arthur Bispo do Rosário, o resultado é melhor ainda, porque o contexto social deles era o mesmo que o de vocês. A arte é um excelente caminho de ressocialização, porque humaniza o olhar”.
Os mais de 40 trabalhos são resultado da oficina “Informação e Cultura”, realizada nas unidades da SDS, que atendem os cidadãos em situação de rua. “Já trabalhávamos a confecção de objetos artísticos nas oficinas, mas, dessa vez, decidimos fazer um trabalho específico, para ser exposto. Escolhemos Arthur Bispo do Rosário porque a arte dele era realizada com materiais do cotidiano, e que está muito ligado à rotina dos nossos atendidos, como materiais que eles encontram na rua. Já o ´Profeta Gentileza` está presente pelas mensagens que ele enviava através do seu trabalho, propondo uma mudança de perspectiva nas relações e na comunicação com o outro. Estudar a biografia destes dois artistas foi muito interessante, porque possibilitou a identificação das pessoas envolvidas nesse projeto”, explicou Maria Cláudia Siqueira, coordenadora executiva da Amac.
Arte das ruas
Jean Carlos foi um dos maiores entusiastas do projeto: “Está sendo uma atividade renovadora. Essas criações me deram uma nova visão sobre mim mesmo. O ´Profeta Gentileza`nos diz que nossa força está na cabeça, e este trabalho, junto com o acompanhamento dos psicólogos do Centro Pop, esta sendo muito bom para mim. Acredito que a arte pode, inclusive, abrir portas para o trabalho no futuro”.
Realizando trabalhos artístico pela primeira vez, o usuário do Centro Pop, Samuel Francisco Pinto, 27 anos, acredita que as oficinas foram a oportunidade de dar vez a um talento nato: “É impressionante as possibilidades que a criação permite. Através da arte, você pode fazer qualquer coisa que venha na cabeça. Acho que já tinha guardado comigo esse dom há um tempo, e agora pude manifestá-lo”.
Samuel relatou que já foi usuário de drogas e que está há três meses sem fazer uso de qualquer substância ilícita, e que a participação nas atividades do Centro Pop está sendo fundamental neste processo: “Arte é educação, ela ensina a simplicidade, a humanidade. Hoje acredito que sou uma pessoa melhor, só quero praticar a gentileza. Estou no auge de um processo de recuperação que está sendo difícil, mas há tempos não vivia um sentimento tão grande de bondade e gratidão dentro de mim. O Centro Pop está sendo um pedestal, uma instituição na qual a gente se apoia e que proporciona um escape para o trabalho. Afinal de contas, não somos moradores de rua, estamos em situação de rua”.
A exposição “Rua, Arte e Fé” pode ser conferida até 2 de agosto, de terça a sexta-feira, entre 9 e 21 horas, e nos sábados e domingos, das 10 às 18 horas.
* Informações com a Assessoria de Comunicação da Secretaria de Desenvolvimento Social, pelo telefone 3690-8314.