Considerada a Audiência Pública mais longa da Câmara Municipal – e uma das mais representativas e de alta qualidade – após cinco horas de debates sobre a suspensão das atividades da Casa de Parto, desde 27 de agosto de 2007, pela Universidade Federal de Juiz de Fora, o vereador Flávio Cheker, proponente da reunião, enfatizou que o Ministério da Saúde apóia a construção de Centros de Parto Normal, como é o caso da instituição juizforana, e requereu a imediata ativação da entidade.
Flávio afirmou que Juiz de Fora está na vanguarda desse tipo de procedimento e também no que diz respeito à aprovação e execução de programas que humanizam os partos, contribuindo assim para diminuir a mortalidade materna. Depoimentos como o da médica carioca e PHD em Ciência do Início da Vida, Eleanor Madruga Luzes, que veio a cidade somente para participar da audiência, sugeriram que muitos problemas sociais dos grandes centros, como a violência, estão diretamente ligados ao desrespeito ao momento do parto.
Com o plenário cheio e participativo, o debate ficou acalorado quando o representante da UFJF, o assessor jurídico Nilson Leão, disse que a Casa de Parto não segue as normas nacionais, previstas pelo Conselho Federal de Enfermagem (Cofen) e pelo Ministério da Saúde, como “a falta de manutenção de profissionais e equipamentos necessários para a realização dos trabalhos”. Ele explicou sobre os riscos de se manter funcionando um lugar sem medicamentos necessários, ambulância à disposição e profissionais capacitados para atenderem urgências e emergências. “A Universidade não está contra a Casa de Parto, mas mantê-la tem sido oneroso para a UFJF, uma vez que seus gastos são muito maiores do que os recursos adquiridos. E, em atendimento à determinação jurídica, ficou decidido a suspensão dos partos naquele órgão”, disse.
A sociedade civil e as entidades representativas do setor de saúde fizeram incisivos pronunciamentos em defesa da tese de humanização dos partos e pelo direito e importância da mulher em escolher a melhor forma de dar à luz seus filhos. Além disto, os argumentos da UFJF foram todos rebatidos, mostrando que a instituição tem legalidade para continuar suas atividades e que o local indicado pelo Reitor para abrigar a “nova” Casa de Parto, em duas salas no CAS, é totalmente inadequado, por apresentar altos índices de doenças infecto-contagiosas em suas proximidades. Os profissionais e usuários da entidade alegaram também que o ambiente proposto descaracteriza a filosofia de “aconchego” para a qual a “Casa de Parto” foi criada.
Representantes do Conselho Regional de Enfermagem (Coren) afirmaram que o parecer do Cofen é sobre a transferência da Casa de Parto e não sobre a suspensão das atividades. No entendimento do Conselho Regional, “todos os profissionais estão capacitados para desenvolverem o trabalho e que não há impedimento legal que os impeçam de assumirem suas funções na instituição. Além disto, as usuárias da entidade não podem ser consideradas como números estatísticos, mas como seres humanos com direito de escolha. E os atendimentos são feitos dentro do prazo estipulado pela Organização Mundial de Saúde (OMS)”, alegaram.
Flávio Cheker apontou para a necessidade da Casa de Parto permanecer ativa no mesmo endereço (no prédio localizado atrás do Museu de Arte Moderna da UFJF – localizada na Rua Santo Antônio, 309) e alertou a Universidade que se a mesma pretende dialogar e encontrar uma solução para o impasse, que comece por retirar o processo administrativo instaurado contra os profissionais da Casa de Parto.
“Acredito que a Reitoria queira, realmente, ter uma administração democrática e que não vai querer ser apontada como aquela que, historicamente, deu um passo atrás e retrocedeu em um movimento social tão importante. Será que o Reitor vai querer ser apontado como aquele que retirou uma conquista da saúde pública e abortou esta experiência, apesar de a mesma ser tida como referência por outros municípios, em todo o país e também no exterior?”, indagou Cheker, muito aplaudido pelo plenário.
Flávio garantiu que irá levar as propostas e as manifestações de protesto ao reitor da UFJF, Henrique Duque, no sentido de sensibilizá-lo a permitir que a Casa de Parto volte as suas atividades. Foram repassados à Câmara: abaixo-assinado com mais de 1700 assinaturas solicitando a retomada das atividades; DVD sobre a Conferência Nacional do Parto – RJ (com participação de mais de 2500 pessoas de todo o mundo); livro: “Best Centers” ; artigos: “Evidências Científicas” e a sugestão da psicóloga americana (também presente na audiência), Laura Uplinger, para que se leia o livro: “Neurociência – Inteligência Social”.
“Não podemos deixar que essa tão importante parceira das gestantes fique fadada a fechar suas portas sem interlocutores que a defendam. Nós estamos empenhados nessa luta e faremos de tudo para que a Casa de Parto da UFJF, umas das pioneiras no país, não encerre os seus trabalhos de forma tão penosa para a sociedade”, ressaltou o vereador.
A Casa de Parto, criada em dezembro de 2001, é um projeto da Faculdade de Enfermagem que tem por objetivo o atendimento de parto humanizado, sendo o terceiro exemplo desse atendimento no Brasil. O projeto tem como proposta realizar partos sob a prática do parto normal entre gestantes de baixo risco, prestando auxílio antes, durante e depois do nascimento da criança. Funcionando 24 horas por dia, a Casa oferece também atendimento educativo às mulheres, oficina de preparação do casal, atendimento ao recém-nascido e incentivo ao aleitamento materno.
O cuidado e a dedicação da equipe, composta por enfermeiros obstetras, auxiliares de enfermagem, assistentes sociais e auxiliares de serviços gerais foram apontados, por várias usuárias, como forma de realizar partos com tranqüilidade e conforto, através de um atendimento especial e um ambiente acolhedor.
A audiência pública foi realizada no dia 09 de janeiro de 2008, no plenário da Câmara Municipal de Juiz de Fora, e contou com a presença de membros do Coren – MG (Conselho Regional de Enfermagem), da Associação Brasileira de Obstetrícia e Enfermeiros Obstetras (Abenfo), Enfermeiros da Casa de Parto de Belo Horizonte, Movimento Mulheres em Rede pela Maternidade Ativa, representantes da ONG Pensamento Ecológico (RJ), da Yoga para gestantes e Doula (RJ), Delegacia de Repressão a Crimes contra a Mulher, Conselho Municipal da Criança e do Adolescente, Ouvidoria Municipal de Saúde, REHUNA (Rede pela Humanização do Parto e Nascimento)- RJ, Psicólogos Perinatal, Médicos Antroposóficos, Professores Universitários, funcionários, enfermeiras, Coordenador do DCE, representantes da Frente em Defesa da Casa de Parto e de outras entidades defensoras do parto humanizado.